Cidadania, Movimentos Sociais

Rebelião popular em Dourados, Mato Grosso!

Egon Dionísio Heck *

Adital –

Realidade ou ficção? Desta vez não é a rebelião dos presos pobres, dos índios injustiçados, dos tangidos pelas drogas, dos famintos à beira da estrada, das vítimas do agronegócio e da vergonhosa entrega de nossa soberania e terras aos grandes grupos nacionais e multinacionais. A revolta, indignação, tensão é em frente à Câmara de vereadores de Dourados. O que poderia parecer apenas mais um dia 13 quente, uma noite de aparente calmaria, se transformou em mais um ato de rebeldia, de repressão policial utilizando bombas de efeito moral e balas de borracha contra a população que se reunião em frente ao prédio que era para ser do povo, mas que se transformou numa casa de ladroagem, conforme as denúncias que foram sendo feitas pelos organizadores do ato de protesto.
À noite veio e com ela a chuva. Dourados amanheceu de cara lavada. As ruas se enfeitaram do verde e amarelo da sibipiruna. Mas, as manifestações e protestos continuarão hoje (15.9).

A violência dentro e fora

A Câmara Municipal de Dourados propiciou mais um triste espetáculo. A grande maioria dos que foram para assistir a anunciada sessão, foram retidos por um batalhão de policiais (mais de 200 mobilizados no esquema de segurança). A população começou a gritar “fichas sujas, lá dentro, aqui fora os ficha limpa”. Lá dentro o faz de conta que tá tudo bem. Escolhe-se uma nova mesa. O presidente preso renuncia. Os suplentes assumem no lugar dos demais presos. Os que já foram soltos se sentem inocentes. Tudo democraticamente recomeçando, como se nada se passasse. Mas a mobilização popular mostra que existe uma consciência clara da gravidade dos fatos, que exigem providências radicais.

Quando um dos populares insistiu em entrar na Câmara, foi imediatamente preso. Foi o suficiente para que a população reagisse buscando romper a barreira policial. Foram imediatamente lançadas bombas de efeito moral e tiros com balas de borracha. A porta de vidro veio abaixo. Chegaram mais policiais. A população revoltada não parava de gritar: os ladrões estão lá dentro. Deixem de reprimir e agredir o povo honesto e trabalhador. Um boneco pendurado e cartazes lembravam o lúgubre realidade, pedindo um descanse em paz, fique longe… Depois de meia hora de violência, algumas pessoas feridas pelas balas e bombas, foram levadas ao hospital. Dentro da Câmara, os vereadores foram literalmente se esconder no plenarinho, pois a sessão foi logo encerrada por falta de segurança.

Destino de Dourados

Conforme o coordenador o coordenador “O destino de Dourados pertence ao povo, é a democracia que nos dá esse direito”. O movimento popular quer a cassação de todos os envolvidos no esquema (dos 11 vereadores, 10 estão envolvidos) de fraudes nas licitações e pagamento de propina. Conforme um dos diretores dos trabalhadores em educação de Dourados “esses vereadores deveriam ter a dignidade de renunciar ao cargo”. O clamor das ruas é por nova eleição para prefeito. Conforme uma enquete realizada pelo jornal eletrônico Campo Grande News, com 1.563 pessoas em Dourados, 81%, ou seja, 1.270 disseram que deve haver novas eleições.

Racismo e indignação

No jornal eletrônico Dourados News, após a descrição dos acontecimentos na Câmara de Vereadores de Dourados, um leitor identificado como Henrique postou o seguinte comentário “Essa quadrilha de vereadores que invadiram nosso querido Dourados subestimaram a força e indignação do povo Douradense, aqui não tem só índios se enforcando e tráfico de drogas, tem muita gente boa, honesta e trabalhadora e que não aceita e nem engole essa ladroagem aos cofres públicos… JUSTIÇA JÁ, URGENTE, RENUNCIA JÁ”.

É pena que o leitor, que com tanta veemência manifestou sua indignação não tenha se libertado de seu preconceito e racismo contra os índios, se perguntando se esses enforcamentos e drogas não são exatamente fruto dessa mentalidade e política da elite que se enricou nessa região através dos mais diversos estratagemas, mas principalmente pela invasão de terras indígenas e usurpação dos recursos naturais. É lamentável que a indignação também não se volte sobre a entrega de grande parte das terras aos estrangeiros, grandes grupos multinacionais ligados à agroindústria e agronegócio.

É importante lembrar ao indignado leitor que de nada resolve trocar simplesmente de vereadores e prefeito, se não mudar o sistema de gera e acoberta essas roubalheiras. Sugerimos que aproveite o ensejo e em sua luta por justiça e dignidade peça a imediata demarcação de todas as terras indígenas e quilombolas, sem terra e sem teto.

Movimento Povo Guarani Grande Povo
Dourados, 14 de setembro de 2010

* Assessor do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) Mato Grosso do Sul